sábado, 31 de maio de 2008

PROSA CONTAMINADA DE POESIA


É DOURADO O SONHO. AS COISAS SÃO BEM MAIS CONTEMPLATIVAS... MEUS SENTIDOS ESTÃO MAIS AGUÇADOS... VEZ POR OUTRA UMA CULPA ME BATE; QUALQUER SENTIMENTO QUEIRA ME TER A SEUS PÉS... O PASSADO ÀS VEZES RETORNA DE DIAS QUE SE IMITAM - TALVEZ PORQUE EU GOSTE DE RECONSTRUÍ-LOS... OS SENTIMENTOS ESTÃO DEIXANDO DE SER ACINZENTADOS. ACHO QUE JÁ É TEMPO DE SENTIR O GOSTO VERDE DA ESPERANÇA, EM DIAS ASSIM EU QUERO SENTIR O GOSTO DO INVERNO CARIRIENSE - ESSA ENERGIA SINGULAR NOSSA... SÃO DIAS DE QUEBRANTO, DIAS EM QUE QUERIA UM ACALANTO, E ISSO ME ILUMINASSE, E ISSO ME EXTASIASSE... ÀS VEZES ESSAS COISAS QUE NOS TIRAM DO PRUMO SÃO SEDUTORAS DEMAIS... OS COMETAS DEIXARAM DE SER MAIS VISÍVEIS, MINHAS ATMOSFERAS DEIXARAM DE TER UM GOSTO SURREALISTA...
a escrita é uma sedução...


Hérlon Fernandes Gomes, Brejo Santo - CE, 31 de maio de 2008.

quinta-feira, 29 de maio de 2008

CRISTIAN NO SERENO - RADIOGRAFIA DA ALMA


Seu corpo estava entregue às coisas mais solitárias e geladas. Acostumara-se ao frio da madrugada, à umidade do sereno. Eram sensações habitantes da alma – ela parecia absorver tudo isso através de uma força metafísica. Também estava ficando assim gelado, assim frio, solitário... A carne lhe roubara em muito o encanto das sensações sublimes. Era dada a ele a oportunidade de viver uma história de amor? As janelas do quarto estavam abertas ao tempo. O frio noturno velava seus pensamentos sonolentos... A respiração pesada e lenta mostrava que padecia de um sofrimento do íntimo.

Hérlon Fernandes Gomes, Fortaleza - CE, 24 de maio de 2008.

P.S.: A quem velou meu sono nesta noite.

terça-feira, 27 de maio de 2008

A MOEDA DA VERDADE

Saiu de casa sem olhar para trás. Pairava no ar uma atmosfera de inquietude, de certeza também. Pela primeira vez na vida parecia tomar uma decisão acertada. Corria para o mar. Diante da impotência da alma, o mar lhe devolvia uma sensação de paz. Tirou os chinelos, queria sentir a areia úmida entre os dedos, a frieza do chão. Precisava entregar-se à natureza primitiva, lembrar que um mundo inteiro pulsa esquecido dos fantasmas que ela alimentava. Silêncio na mente. Tentava silenciar a mente com pensamentos que tivessem a temperatura daquele instante. Sentia-se cansada, percebia que carregava pesos esquecidos, coisas inexatas que não se explicavam meramente com palavras e atitudes. Sentou-se numa porção mais alta da praia. A tarde ia caindo em tons laranjas... A paisagem compensava esse vazio. Laura precisava acreditar na existência de uma luz, sua luz. Sua força íntima de se elevar precisava ser ativada, talvez por essa derrota que se operava em sua vida. O fim do amor era uma coisa triste. E onde se perdera? Onde depositara todo aquele sentimento? É, aparentava afugentar-se da treva, como do frio para a quentura matinal.
A verdade dos fatos apagava as falsas tintas do que julgava viver. Acordava-a sonolentamente de um coma da alma. Nesses últimos meses de claustro íntimo, buscava encontrar coragem de acatar as ordens das próprias verdades.
Viraria aquela página. A gente precisa sepultar passados; algumas lembranças precisam ser esquecidas – porque a morte de um sentimento é capaz de conceber essa espécie de encanto.

Ele era diferente dela. Não era adepta do ditado de que os opostos precisem se atrair e darem certo. É mentira cômoda de se acreditar. Sérgio era prático, ela gentil; um transava com tesão, ela fazia amor. Eram situações quase corriqueiras que se revelavam e descascavam o brilho do bronze. Os impulsos íntimos e primitivos de Laura alimentavam-se de sentimentos de paz; ele acreditava numa ordem própria, baseada na sua tirania, no seu discurso convincente. Ele gostava de deter tudo sob seu controle, principalmente pessoas. Com seus parceiros de negócios a mentira era uma espécie de moeda de troca... O casamento facilitou essas pistas. Ele jogava também assim com ela; mas a moeda dela revestia-se de verdade.
Seu valor seria compensado.


Hérlon Fernandes Gomes - Brejo Santo - CE. 27 de Maio de 2008.
P.S.: Para Gianini, no frio do Sudeste...

sexta-feira, 23 de maio de 2008

O NOIVADO

Vixe que a vida é uma caixinha de surpresas mesmo! Não, eu nunca imaginei que meu amigo mais maluco fosse inventar de querer casar com minha irmã... Olhando um pouco para trás já faz um bom tempo, tem o gosto da lembrança de um cigarro Gudam-Garam, ao som de Legião, num sopro de chuva, de muitas comemorações...
Bruno sempre teve os pés em Saturno, acredita em utopias revolucionárias, é uma das pessoas mais divertidas que conheço.
Heloísa é também essa metamorfose ambulante, do casulo até à forma de borboleta-fada, capaz de produzir a própria luz. Brindar no final teve sempre a cara do seu gesto cotidiano!
Eis que, entre tardes gravando cd’s, vendo filmes entre família, observando Heloísa e todos os seus processos de alquimia capilar, no meio de tantas conversas, piadas... Entre tudo isso ia se formando uma coisa imperceptível, que parecia estar ali sempre, mas precisava de um tempo-ótimo para despertar.
No começo eu achei que ela tinha bebido demais, procurei motivos para não acreditar no óbvio, no tão simples, no inusitado início de uma história de amor. Mas agora está aí, diante de todos vocês, entre pedidos formais como o desta noite... Lembrei de um texto de Benjamin Constant: "Todo sentimento precisa de um passado pra existir. O amor, não. Ele cria como por encanto um passado que nos cerca. Ele nos dá a consciência de havermos vivido anos a fio com alguém que há pouco era quase um estranho. Ele supre a falta de lembranças por uma espécie de mágica."
Porque o amor é essa insistente vontade de estar junto sempre, de querer o melhor pro par, de se apaziguar após discussões ridículas; é ser flexível no momento oportuno, é se doar... E é preciso acreditar no amor, em cerimônias que sirvam para celebrá-lo, porque ele é coisa santa, é presente de Deus.
E eu me sinto feliz com esse Noivado, do futuro Sr. Bruno e da futura Sra. Heloísa, almas irmãs da minha!
Estou aí em presença, meu sentimento de felicidade comunga com o de vocês! Felicidades!


Hérlon Fernandes Gomes, Fortaleza - CE, 23 de Maio de 2008.

terça-feira, 20 de maio de 2008

NOUVELLE VAGUE

NOUVELLE VAGUE

Saio de lá esquecido de alguma coisa d´alma,
De alguma coisa que pareço deixar de mim
E parece me deixar mais um vazio.
E será que é um vazio triste?
E será que é estar sob a na névoa fria?...
Estou mesmo meio perdido nessa selva de emoções,
Estou mesmo entregue a esse passado de esperanças caducas...
***
Mas há dias de sol no meio dessa cinza,
Desse frio que aqui é novidade,
Desse poder que tem teu pensamento.



Hérlon Fernandes Gomes - Crato - CE, Crato - CE, 20 de Maio de 2008.

domingo, 18 de maio de 2008

FERIDO

Ele estava no mato, sob a chuva e sob a escuridão desvanecida por um ou outro relâmpago. Estava nu, sentindo a lâmina do frio, bem mais preocupado em estar em sincronia com o mundo, participar do mecanismo simbiótico da vida. Não, não tinha palavras para comunicar o que sentia, mas o fazia mesmo assim, através dos seus instintos, dos seus sentidos, do medo e da vontade de sair daqueles domínios, de voltar a sentir a iluminação da liberdade em seu íntimo.

Hérlon Fernandes Gomes, 18 de maio de 2008. Brejo Santo - CE... Dias preguiçosos...

À ZELIA GATTAI, COM CARINHO

Hoje o mundo das letras está de luto. Quando se perde um escritor, perde-se também mais da compreensão humana.
Vinha acompanhando aflitivamente o estado de saúde da escritora Zélia Gattai, essa mente lúcida adoradora da vida, das coisas simples.

Jorge Amado é meu escritor mais admirável. Li avidamente seus inúmeros romances e ainda pude partilhar de sua presença viva. Em 1997, resolvi escrever a ele sobre minha satisfação por sua obra, por sua pessoa e, receber resposta a essa carta, foi de uma emoção ímpar. Tenho um “Gabriela, Cravo e Canela” autografado por ele, como um verdadeiro troféu de um fã.
Ainda guardo recortes dos principais jornais e revistas que noticiaram a morte do meu escritor maior.
Paralelamente à obra amadiana, mas não à sua sombra, desenvolveu-se a literatura de Zélia Gattai. Apaixonei-me por “Anarquistas, Graças a Deus”, tornei-me íntimo da vida da menina Zélia, filha de imigrantes italianos. Viajei com o casal a diversos lugares em “Um chapéu para viagem”, “Chão de meninos”, “A casa do Rio Vermelho”, “Città di Roma”... Tenho quase todos autografados por Zélia, sempre tão gentil, tão solícita em responder a seus leitores.
Lembro que uma vez assistia à uma entrevista de Zélia mostrando algumas fotografias das quais ela eternizaria momentos em família. E ela falava a respeito de um livro chamado “Reportagem Incompleta”, uma iconografia da vida de Jorge Amado, feita através desse registro ao longo dos mais de quarenta anos de convivência. Procurei o tal título por todas as livrarias, catálogos, mas não encontrei. Resolvi escrever para Zélia e saber se o livro estava esgotado ou o quê. A resposta veio em um grande envelope, dentro um cartão gentil, com timbre da ABL, e um exemplar do livro, dedicado e autografado! Acho que foi um dos melhores presentes que recebi em toda minha vida. Descobri que o “Reportagem Incompleta” é uma tiragem limitada, de 1986, hoje uma das peças sentimentalmente mais valiosas da minha biblioteca.
Abraço toda a família neste momento de partida, especialmente você, Paloma, que já nos havia presenteado com relato tão lindo em “Um baiano romântico e sensual”, livro escrito a três mãos. Fica a incumbência do cuidado de toda a valorosa obra deixada entre nós, uma obra que ficará aí, desafiando o tempo e a vida, tendo o sabor desse sorriso iluminado da sua mãe querida.


Hérlon Fernandes Gomes, 17 de Maio de 2008 - Brejo Santo - CE.
P.S.: Aos filhos de Zélia Gattai: Luiz Carlos, João Jorge e Paloma, um abraço carinhoso neste momento difícil.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

AS RÉDEAS DE MARINA

Marina tem o hábito de tomar tranqüilizantes para antecipar o sono, porque sua mente passou a exigir demais do seu corpo. Era preciso às vezes fazê-la entrar em stand-by.
Pensava agora em todos os seus desastres amorosos, porque por mais que ela compreendesse a parte boa de cada convivência, os fins sempre aconteceram de maneira desastrosa. Acreditava que não nascera para as coisas do amor... Mas não entendia o próprio coração a lhe colocar nessas amarras de uma paixão desafiadora como aquela.
No começo, achou que aquilo era só desejo, curiosidade... Laura parecia uma mulher tão feliz nos braços de Sérgio. Invejou essa luminosidade-feliz da amiga, vai ver o reflexo do que ele realizava em sua vida... Seria só desejo? Precisava ser uma atriz para não se denunciar diante de um olhar mais profundo.
Não bebera quase nada naquela noite. Sóbria, daria-se o presente de analisar as atitudes do casal amigo, de encarar seu desejo secreto. Laura, quando bebia, esquecia-se do marido e ele se perdia entre outros olhares e perfumes.

Hérlon Fernandes Gomes, 15 de maio de 2008 - Brejo Santo - CE.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

NA CONSCIÊNCIA DE CRISTIAN

Queria ser desejado de outra maneira, queria alguém que se preocupasse de verdade comigo. Não, isso não me faz sentir fraco; canso-me dessa sede de auto-suficiência. Ter alguém em quem se apoiar é impulso humano, torna-nos menos egoístas...
Era isso que ele tinha sido o tempo inteiro, rodeando-se de luxo e solidão. Para quê? Para quem? Antigamente o significado tinha alguma serventia, tinha gosto de prova irrefutável... E agora, era apenas ele ali, em finais de noites intermináveis, cheio do vazio desse falso amor vendido, de sua crua solidão.

Estou cansado de ter pressa. Ela existe em mim como uma cobrança que me percorre todo... As coisas parecem se equilibrar, o acaso mesmo se preocupou disso. As lembranças difíceis deixaram esse patamar do inexorável, agora podem visitar-me sempre, estão todas bem cicatrizadas, atestam apenas a existência de uma ferida necessária. Reúno meus cacos, minhas coisinhas, nesse mundo de diminutivos que não me diminui. Estou voltando a caminhar, a refazer o percurso de estradas abandonadas. Voltei a me iluminar, a tornar as coisas menos impossíveis, a acreditar mais nos meus sonhos, a me sentir capaz de construir uma felicidade desejada. Estou buscando essa segurança em Deus – preciso reconhecer isso. Ultimamente estamos mais cúmplices, embora eu continue profanando as regras, contaminando as águas... Ele sempre arranja uma maneira de me fazer sentir purificado.

Hérlon Fernandes Gomes, Brejo Santo - CE, 14 de maio de 2008.

sábado, 10 de maio de 2008

PEREGRINO

Por que você é assim como uma vaga que me quer tragar? Por que esse desejo inconseqüente, que me faz calcular os gestos para não me denunciar? Se até mesmo eu chego a me achar ridículo, a titubear no meio da multidão pelo poder da sua imagem no meu pensamento? Vou ao banheiro, lavo o rosto. Sensação de alívio, de frieza, de pureza... No espelho procuro encontrar minha melhor face, a que melhor me apresenta... Retorno à mesa, as doses de uísque talvez já me confundam... Gosto de me lembrar que seu desejo é a coisa que mais me inquieta, que pode me livrar de qualquer tédio, que me faz perder horas do meu tempo... Penso que possa estar voltando a ser patético, a me apaixonar de maneira imperceptível, em aventuras perigosas que estão sempre a me desafiar... Concentro-me na música, alguma coisa que me traduz a paz. É Bob Marley nas caixas de som.
Esqueço até de culpas para pensar em você, permaneço feliz na monotonia desse tempo, que me repete você como uma lembrança constante. E eu gosto de alimentá-la, certamente porque me seja a mais proibida, a mais desafiadora, principalmente agora, eu estando tão frágil diante das desesperanças comuns.
Respiro fundo, um princípio de sono me trai; mas voltar para casa e me saber nesse vazio de solidão... Prefiro perambular um pouco pelas ruas. O frio da noite me faz sentir especial, por me poder notar vivo. As coisas burocráticas da vida tendem a tornar tudo comum... De repente, esse vento gelado me desperte de encantos otários... Mãos nos bolsos, chego em casa, acendo o meu cigarro e rezo por um sono tranqüilo.

Hérlon Fernandes Gomes, Brejo Santo - CE, 11 de maio de 2008 - Madrugada.
P.S.: Este é dedicado a esta noite, cheia de companhias agradáveis: Yacub, minha irmã Helaine, Danielle, Gal, Jailson, Admária, Wilame Jr., Danton, meu primo Wilker, ao som da Dona Chicá. Teve também Wadson de supresa no final. Noite cheia de esperanças...

À MINHA MÃE, COM AFETO.

As mães são certamente uma das coisas sagradas deixadas por Deus. Acho que foram ungidas com uma espécie de missão e sacerdócio conferidos aos anjos... Das coisas desta vida que mais me engrandecem, que sempre me alentam, que nunca me frustram, o amor materno segue coroado em primeiro lugar.
Percebo que Deus foi muito bondoso comigo e me presenteou com uma mãe incrível. Ela é minha melhor professora, pois formou meu caráter, esculpindo-me assuntos que geralmente transcendem o conhecimento intelectual.
Criou os quatro filhos sob o governo da união, na repreensão necessária, nas limitações de uma vida brasileira; mas sem jamais permitir que nos decepcionássemos com fatos supérfluos. Na sua batalha diária, sempre nos fez acreditar que o amanhã pode ser melhor, porque dava o melhor de si para todos. Algumas vezes sonhávamos com brinquedos impossíveis, longe da realidade de nossas posses, e ela nos convencia da melhor maneira possível, fazendo-nos compreender o limite das nossas vontades, consolando-nos com outros presentes, encantando com sua mágica nossos humildes brinquedos. Minha mãe tinha satisfação em nos fantasiar no carnaval, em posar conosco para fotografias que hoje trazem esse gosto bom de saudade. Minha mãe sempre se preocupou com nossa educação, pois seu tato é sutil para compreender que é o conhecimento que salva um homem dessa vida-selva.
Mãe é espírito. Quantas são as que parem e não fazem jus à incumbência sagrada? A minha possui esse mecanismo que nos liga através da alma. Ela me compreende com um olhar, nos pequenos gestos, no sentido exclusivo de todas essas Marias.

Quando tudo parece estar amargo e sem graça em minha vida, a lembrança de minha mãe tem esse poder pleno de me engrandecer, de me colocar grato diante da existência, de poder compartilhar desse amor, que é o maior presente recebido de Deus.
Minha mãe é um ser incrível, generoso. Compadecida das coisas mais simples: ama as plantas, os animais; tem o sentimento à flor da pele; rainha da concórdia na família; generosa, caridosa; é a melhor advogada dos filhos.
Não preciso dizer que a amo - nossas almas dizem isso uma a outra, constantemente! Feliz dia das mães!


Hérlon Fernandes Gomes, Brejo Santo - CE, 10 de maio de 2008.

OLHOS DE JAGUAR II

OLHOS DE JAGUAR II
São olhos que enfeitiçam,
São olhos que convidam,

São olhos que me tentam

Num relance oblíqüo,

Numa fuga que me deixa o rastro.

Queimo-me quando me observam,

Estremeço-me diante dessa fantasmagoria,

Dessa alquimia do seu olhar.

Esse encontro dos seus olhos vicia-me,

Inquieta-me, envolve-me...

Eu, muitas vezes, desvencilho-me deles

Na minha razão - que é fraca,

Que é bem menor do que o desejo de ter você.


Hérlon Fernandes Gomes , do novo livro QUESTÕES DA ALMA.
P.S.: Todos temos desejos secretos que gostamos de ao menos alimentar. Um poeta cearense escreveu que desejar é melhor que possuir... Será?

sexta-feira, 9 de maio de 2008

A RESPOSTA DE LAURA

Ela achava que vivia uma espécie de fracasso. Soava meio pateticamente, mas intimamente se admitia assim. Seus planos foram outros, eram impregnados de um verniz de eternidade. Acreditou uma vez no “pra sempre” e suas esperanças foram se enfraquecendo. Era uma dor na alma que ela não sabia identificar bem. Houve amor em algum tempo, um tempo muito feliz, incomunicável até que percebera o quanto se diminuíra nesses anos.
Sentia-se um troféu do marido. Em algum momento, confiou piamente. Entregara-se toda a ele, arrastara-se consumida por um amor demais. Para quê só agora enxergava o óbvio? Ele amava os caminhos que ela lhe abria, não à sua pessoa. Deixara-se dominar, por querer inconscientemente acreditar que suas profecias mais simples se realizariam, por tentar dar uma chance a si mesma.
Era momento de revidar, talvez uma resposta a si mesma. Cansou-se de ser apenas uma peça no seu quebra-cabeças.

Comunicaria a Sérgio, naquela noite, que no início do ano assumiria o controle da empresa. E não seria um controle superficial. Precisava se sentir viva e útil; precisava reconhecer que em algum momento da vida conseguira caminhar com os próprios passos, construir seu próprio destino e não esperar de graça o poder do acaso. Uma coisa tão simples que parecia se revelar como a coisa mais extraordinária.
O
s dias vindouros deveriam ser momentos em que se daria ao luxo de levar um rumo sem priorizar o marido; preocupando-se muito mais com coisas, fatos que dissessem mais respeito a ela. Como criatura, deveria marcar o próprio terreno e se impor, estabelecendo seus limites, suas escolhas.

P
recisava voltar a se achar bonita, primeiramente porque agradaria a si mesma e isso deveria lhe bastar ao menos na causa principal.
Tinha sido uma mulher dona de si desde sempre, por que agora precisaria de alguém que lhe desenhasse mapas? O amor precisava ser algo palpável, sentido, como algo que muda as cores do dia. Respirou fundo e se deu um "sim" de presente.

Hérlon Fernandes Gomes, Brejo Santo - CE, 10 de maior de 2008.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

RACHEL - UMA PRESENÇA REAL E FELIZ

Vou abrir um parêntese muito bem merecido, não como uma simples homenagem, porque ela está além disso, mas como testemunho de que ela existiu em minha vida e não foi uma lembrança passageira. Rachel significa a fêmea do carneiro, preferida de Jacó, merecedora de filhos. Tive o agraciado presente de poder conviver pouco tempo dessa graciosa companhia e de ter podido aproveitar tamanha luz, traduzida num sorriso perene e gratuito.
E
la tinha vaidade, tinha leveza nas palavras, admirava Raul Seixas e parecia compreender melhor os sentimentos que não estivessem simplesmente à flor da pele, já que ela era mais feita de alma. Hoje eu lembrei dela, não simplesmente porque a morte a arrebatou precocemente, mas porque certamente seu sorriso me iluminaria e me traria uma palavra de conforto e fizesse minha noite ser menos triste.

Q
uantas conversas, quantas promessas, quantas vontades... E eu me lembro bem da nossa última conversa, da nossa despedida – que não tinha cara nem motivo de uma! Eu, você e Wilame, sob a atmosfera do álcool, do calor da nossa amizade, da beleza do amor de vocês dois a me compreenderem, a me traçarem promessas de felicidade... Eu também custo a acreditar e aceitar esse curso natural da vida, que não deixa de ser triste... E eu também sinto falta de sua presença, do seu sorriso sempre branco e cheio desse conforto impagável!

D
aí de onde está, quero que sempre se lembre do que nós acreditamos! Saiba que estarei aqui reverenciando a vida e sabendo que o curso dela vale à pena até o último suspiro – porque era assim que seu semblante inevitavelmente parecia suscitar... Sua lembrança jamais será triste. Terá sempre o gosto de uma saudade insaciável, mas sempre reconfortadora pela certeza de poder ter compartilhado com você de momentos ímpares – amostras fiéis da sua humildade, do seu profundo amor, da sua inocência.
Hoje, eu lembro de você, porque foi singular pra mim e pra inúmeras pessoas, na sua singeleza, na sua calmaria que sempre foi conforto! Esteja sempre ao lado do Pai.
Do amigo que ficou. Eternas saudades.

P.S.: À minha amiga Rachel, que se foi desta vida precocemente. A meu amigo-irmão Wilame, que teve o privilégio de proporcionar e compartilhar de seu maior amor. Aos seus filhos, a quem ela amava sem proporções. Aos seus irmãos e familiares. Com afeto.